Brasil pode enfrentar nova onda de semente transgênica irregular

16 anos depois de regularizar plantio e comercialização do 1º produto transgênico, país corre o risco de viver episódio idêntico ao da “soja Maradona”; dessa vez, com o trigo

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São Paulo — O Brasil está prestes a reviver um episódio similar ao da “soja Maradona”, que assombrou o governo, indústrias, agricultores e consumidores entre 1997 e 2003, período em que o grão transgênico, liberado e produzido na Argentina, entrou de forma clandestina no país. Dessa vez, não é a soja que está no centro das discussões, mas sim, o trigo, produto muito mais próximo da mesa e da boca dos brasileiros.

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, deve voltar a analisar o pleito da Tropical Melhoramento & Genética (TMG) que pede a liberação da importação de farinha de trigo argentina, produzida com uma variedade de trigo modificada geneticamente. O tema já havia sido pautado no encontro de 10 de junho, mas foi solicitado documentos e informações adicionais à empresa. O novo debate deve ocorrer em 5 de agosto.

POR QUE ISSO É IMPORTANTE: Com uma produção doméstica de aproximadamente 6,8 milhões de toneladas, o Brasil está entre os cinco maiores importadores de trigo do mundo. A Argentina produz cerca de 20,5 milhões de toneladas de trigo por ano, das quais cerca de 63% são exportadas. Das 13 milhões de toneladas vendidas a outros países, quase metade tem o Brasil como destino. Na prática, os moinhos brasileiros são os maiores clientes dos produtores de trigo da Argentina.

O trigo transgênico HB4, principal insumo da farinha que está na pauta da CTNBio, é resistente à seca, ao defensivo glufosinato e também confere maior produtividade às lavouras. Essa é a única variedade de trigo geneticamente modificada do mundo liberada para o plantio comercial e foi autorizada pelo governo argentino em outubro do ano passado.

CONTEXTO: A autorização para a venda das sementes transgênicas de trigo na Argentina foi concedida à empresa Bioceres. Contudo, a Subsecretaria de Mercados Agropecuários do país vizinho entende que a liberação do plantio de trigo transgênico no país deve estar condicionada à aprovação comercial por parte das autoridades competentes do Brasil, no caso, a CTNBio. Afinal, não faria sentido produzir um trigo que não tem autorização para consumo no maior mercado consumidor do cereal argentino.

A resolução que libera o cultivo na Argentina deixa claro que a Bioceres deve abster-se “de produzir e comercializar as variedades que contenham o evento até obter a licença da República Federativa do Brasil”. Apesar da condicionante, há quem diga que parte da produção argentina deste ano já tenha sido feita com a variedade geneticamente modificada, o que abriria caminho para um novo movimento de contrabando de sementes para o Brasil. A característica de resistência à seca é uma das mais demandadas pelos produtores brasileiros, especialmente depois dos prejuízos registrados neste ano com a estiagem que atingiu os Estados do Sul do Brasil.

Nesse contexto, a Bioceres contratou a TMG para executar o processo de liberação do trigo junto à CTNBio. A escolha da TMG não é por acaso. A empresa brasileira já conseguiu a liberação da soja HB4, também resistente à seca e ao glufosinato e de propriedade da Bioceres. A variedade de soja deve ser colocada à venda no Brasil apenas para o plantio da safra 2022/23, uma vez que a TMG trabalha para conseguir a liberação na China, maior cliente da soja brasileira.

UM POUCO DE HISTÓRIA: Estima-se que o Brasil plante produtos transgênicos desde 1997. A soja iniciou esse processo e se manteve na clandestinidade até 2003, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou uma Medida Provisória autorizando a comercialização do grão irregular. Por vir contrabandeada da Argentina, a semente que entrava no Brasil ficou conhecida como “Soja Maradona”.

O plantio e a venda da soja geneticamente modificada permaneceu em um limbo jurídico até meados de 2005, quando finalmente entrou em vigor a Lei de Biossegurança, que, finalmente, pôs um ponto final no assunto.

  • Lavouras transgênicas existem no mundo desde 1996;
  • Os primeiros países a cultivar safras transgênicas foram Estados Unidos, Argentina, China, Canadá e México;
  • Atualmente, existem 14 produtos agrícolas geneticamente modificados em produção comercial no mundo, que ocupam cerca de 200 milhões de hectares;
  • Soja, milho, algodão, canola e alfafa formam o top 5, mas estão na lista beterraba, mamão, batata, maçã, cana-de-açúcar, abacaxi, girassol, berinjela e abóbora;
  • Mais de 30 países cultivam lavouras transgênicas, sendo 10 apenas na América Latina

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