‘Se a gente não fizer as reformas até outubro, esquece’, alerta economista de banco digital

Alvaro Bandeira, economista-chefe do Modalmais, disse à Bloomberg Línea que vê a proximidade do ano eleitoral como um entrave para o avanço das reformas no Congresso

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São Paulo — A vacinação contra a Covid-19 avança no Brasil e no mundo, trazendo um certo alívio para o ritmo de retomada da economia, mas o mercado já olha para 2022, ano de eleições gerais, tradicionalmente um período de instabilidade política. Para o economista-chefe do banco digital Modalmais, Alvaro Bandeira, o calendário eleitoral tem potencial de turvar o cenário elevando a volatilidade nos negócios, além de afetar o andamento das reformas estruturais, como a tributária e administrativa, ainda em tramitação no Congresso Nacional.

“A janela que a gente tem pra fazer essas reformas está se fechando. Quando chegar lá em outubro ou novembro deste ano você já não consegue fazer mais nada, porque já vai ser um ano polarizado entre esquerda e direita, eventualmente aparecendo uma terceira via que pode tirar votos dos dois lados, e certamente o ambiente político vai estar na ordem do dia porque, não só para as eleições regionais como para eleição majoritária de presidente da República”, diz Bandeira à Bloomberg Línea.

Ele relaciona ainda o risco de decisões unilaterais por parte do Poder Executivo.

“Se a gente não fizer reformas até outubro ou novembro, esquece, porque virou 2022 sem fazer, porque vai ser um ano de eleição. E corre um outro tipo de risco que são as canetas do presidente com uma postura possivelmente mais populista se a eleição tiver polarizada. E aí é que não sai mesmo nada que vá mexer com o bolso da população, com o bolso do contribuinte, porque não vai haver interesse em fazer isso naquele momento. Então é uma situação complicada para a gente e mais uma incerteza, além de todas as incertezas que a gente tem no plano global”, cita o economista.

Por enquanto, Bandeira ainda mantém sua projeção, feita no fim do ano passado, de ver o Ibovespa fechar no patamar dos 135 mil.

“O índice chegou a quase 132 mil pontos recentemente. E eu continuo com 135 mil, mas com cara de 145 mil pontos, numa situação em que a gente tenha um quadro político e um quadro econômico mais positivo. Por enquanto o que a gente tem é muita incerteza”.

Ele lembra que, apesar de se ter vacinação quase completa nos países ricos, ainda há um longo caminho nas nações emergentes e pobres.

“É possível que a gente consiga até o final do ano, e aqui no Brasil um pouco antes, uma vacinação de 70% da população. E aí lá para setembro, outubro, a gente já teria um quadro forte com relação à vacinação”, prevê.

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“Tapering”

Globalmente, a principal incerteza é sobre o desmonte da política monetária e da política fiscal, primeiro pelos países desenvolvidos, que já começam a falar no “tapering”, a retirada de estímulos antes de elevar a taxa de juros.

“Alguns países emergentes como o Brasil e a Rússia, já estão começando a elevar a taxa de juros, enquanto todo mundo está preocupado com a taxa de inflação não ser tão transitória assim, principalmente nos países emergentes”, afirma o economista-chefe do modalmais.

Quanto à perspectiva de quando o Federal Reserve deve subir juros, Bandeira projetou: “Acho que é final do próximo ano e início de 2023, acho que ali entre outubro e novembro de 2022, início de 2023, você pode ter uma alta da taxa de juros nos Estados Unidos, mas antes disso eu acho que você muda a política monetária, principalmente no que diz respeito à compra de ativos, à compra de bônus, o que já começa a restringir um pouco mais a liquidez do sistema financeiro global, e assim vai”.

Para o economista, a esperada redução de liquidez tende a afetar os países emergentes.

“Ao enxugar a liquidez do sistema você pega os países emergentes e as empresas endividadas. Os países emergentes, no geral, estão muito endividados, o Brasil está lá no topo no nível de endividamento em relação ao PIB, empresas também endividadas, depois desse tempo todo de taxas de juros muito baratas ou muito negativas”, afirma Bandeira.

Ele cita o risco de uma crise do sistema financeiro caso as mudanças de política monetária não sejam bem dosadas. “Então é fundamental essa dosimetria do que fazer em termos de retirar um pouco da política fiscal, retirar um pouco da política monetária, ver quais são os efeitos, retirar mais ou soltar um pouco mais, enfim, tentar fazer com que a recuperação econômica global não sofra um impacto maior e a gente caia numa nova crise. Creio que seria não mais uma crise sanitária ou ainda uma crise sanitária com uma crise do sistema financeiro”.

Juros

Bandeira considera o futuro da política monetária nos países ricos como o principal catalisador do cenário global nos próximos trimestres, enquanto o mercado doméstico têm no seu radar o calendário de reformas no Congresso.

“Com certeza esse é o principal driver num plano mundial, mas aqui a gente tem muita coisa pra ser resolvida. E essas incertezas quando chegam aqui, chegam muito pesadas. Primeiro, como vão ocorrer as reformas que são absolutamente essenciais de serem feitas no País? Qual o tamanho dessa reforma? Qual o impacto dessa reforma? Vai ser uma reforma meramente cosmética?”, questiona.

Bandeira ressalva que ainda há incertezas econômicas no horizonte mais amplo. “O que me assusta é não ter uma posição proativa para ajustar o médio e o longo prazo. O curto a gente consegue sanar em parte com tudo isso que eu falei, inflação alta aumentando a arrecadação, você fazendo concessões e privatizações e garantindo pelo menos um pedaço de investimento. Mas é de não termos políticas econômicas de médio e longo prazo que vão levar o País a crescer. Veja bem, a gente está falando no crescimento do PIB neste ano de 5%, 5,5%, tem gente até falando mais do que isso, mas quando a gente olha para o ano de 2022, estamos falando de um ano de 2,5%”.

Investimento

O economista-chefe do Modalmais defende uma sinalização favorável à segurança jurídica no País, a fim de induzir a atração de mais investimentos. Ele lembra que as atuais previsões de PIB para os próximos anos sofrem os efeitos da comparação estatística com os primeiros anos prejudicados pela pandemia da Covid-19.

“Na verdade, de crescimento novo, de reflexo de investimento, a gente está computando alguma coisa próxima a 1%, 1,5%, porque tem o efeito de carregamento do ano de 2021 para 2022, possivelmente da ordem de 1 ponto percentual. Então é preciso que a gente acene com um longo prazo mais favorável, e para acenar com um longo prazo mais favorável é preciso investimento neste País, é preciso que haja segurança jurídica, que a economia sinalize um rumo correto, que esse rumo correto não tenha grandes desvios ao longo do tempo, e que você garanta segurança jurídica para atrair investimento”.