Bradesco apresenta sinais mistos em primeiro resultado trimestral com novo CEO

Segundo maior banco privado do país, sob liderança de Marcelo Noronha, voltou a crescer a carteira de crédito depois de dois trimestres, mas avanço está muito abaixo do guidance do ano

Banco teve aumento da rentabilidade no primeiro trimestre de 2024, mas ainda está aquém dos pares (Foto: Lucas Landau/Bloomberg)
02 de Maio, 2024 | 08:39 PM

Bloomberg Línea — O processo de reestruturação e de evolução dos resultados do Bradesco será gradual e extenso, a julgar pelos números do primeiro trimestre, apresentados ao mercado nesta quinta-feira (2). Esse alerta havia sido dado pelo novo CEO, Marcelo Noronha, em sua primeira manifestação pública há três meses.

O balanço trouxe sinais pontuais de retomada na operação do segundo maior banco privado do Brasil, como melhora da qualidade do crédito com a redução de provisões, custos sob controle e maiores volumes nas linhas de negócios de tarifas e seguros.

O lucro líquido caiu 1,6% no primeiro trimestre no comparativo anual, somando R$ 4,2 bilhões - acima do reportado pelo Santander Brasil (SANB11), de R$ 3 bilhões. E subiu 46,3% na base trimestral.

A rentabilidade do Bradesco medida pelo ROAE (retorno sobre o patrimônio médio) ficou em 10,2% - para efeito de comparação, o Santander Brasil teve ROE de 14,1%. Houve avanço de 3,3 pontos percentuais (pp) versus o quatro trimestre, mas queda de 0,4 ponto na base anual.

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O dado foi impactado pela menor receita de juros cobrados dos clientes (-9%), já que o banco tem evitado conceder empréstimos de maior risco para segurar a inadimplência.

Esse foi o primeiro resultado trimestral “cheio de Noronha, que assumiu no fim de novembro, portanto, com mais da metade do quarto trimestre passado já decorrido.

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“O fim do momento desafiador do Bradesco ainda está distante. O processo de reajuste interno será lento e tortuoso. Estamos menos otimistas do que na passagem de 2023 para 2024 por causa dos recentes agravantes, tanto em âmbito interno quanto externos (fiscal, geopolítica, juros nos EUA e Brasil)”, apontou Rafael Reis, analista que cobre o setor bancário pelo BB Investimentos.

Diante da promessa do novo CEO de uma melhora significativa da rentabilidade no longo prazo (2026), analistas do BTG Pactual mantiveram a recomendação “neutra” para BBDC4.

“Noronha conseguiu ganhar tempo para colocar seu plano em ação. No entanto, atender (ou superar, mesmo que um pouco) as expectativas nestes primeiros trimestres desde que a recuperação foi anunciada é realmente importante, não apenas para investidores mas também para que a equipe do Bradesco acredite que o novo capitão tem o controle do navio”, avaliou a equipe de equity research do BTG.

O novo CEO do Bradesco manteve o tom otimista sobre o cenário macroeconômico de 2024, projetando um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) acima da mediana do mercado. E lembrou, mais uma vez, que a recuperação do banco foi projetada para acontecer ao longo dos próximos anos.

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“Sou um otimista com pé no chão, não estou fora da curva. Vamos crescer. A inadimplência está em queda. No Brasil e no mundo, os economistas estão errando suas previsões sobre o PIB”, disse o executivo a jornalistas.

O balanço do Bradesco cita como cenário-base um crescimento esperado de 2,50% do PIB nacional neste ano. A taxa está acima dos 2,02% da mediana de projeções do mercado calculada pelo último relatório Focus, divulgado pelo Banco Central.

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Na entrevista coletiva, Noronha mencionou sua projeção pessoal de que o PIB subirá “mais de 2%” em 2024 e considerou como positiva a elevação da perspectiva do rating do Brasil anunciada ontem pela agência Moody’s. Há duas semanas, o FMI (Fundo Monetário Internacional) projetou crescimento de 2,2%.

Crescimento da carteira

O executivo destacou que, no primeiro trimestre, o volume da carteira expandida de crédito do Bradesco cresceu 1,2% na base em 12 meses, totalizando R$ 889,9 bilhões. Nos dois trimestres anteriores havia registrado queda. O guidance de expansão da carteira para o ano fica na faixa de 7% a 11%.

A principal dificuldade do banco foi aumentar os empréstimos para micro e pequenas empresas, em que o volume emprestado recuou 1,2%.

O desempenho da carteira de crédito do Bradesco ficou aquém do mercado de crédito como um todo, que se expandiu 8,2% no comparativo anual (dado de fevereiro), segundo escreveu Reis, do BB Investimentos, em relatório.

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“Temos a combinação de uma carteira de crédito que não cresce, aliado a um mix pouco rentável, o que explica boa parte do mau momento do banco”, avaliou Reis, que decidiu manter a recomendação “neutra”para a ação.

Consórcios: maior competição

O balanço do primeiro trimestre revelou pontos de atenção para o Bradesco também em áreas em que o desempenho é tradicionalmente mais destacado.

A taxa de inadimplência em consórcios, que tiveram a terceira maior contribuição para a receita do banco, subiu para 3,87% no trimestre encerrado em março, ante 3,75% no que acabou em dezembro.

Houve ainda queda no total de grupos administrados (de 3.238 para 3.165).

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Por outro lado, as receitas com consórcios subiram tanto na base trimestral (+6,8%) como na anual (13,7%), o que sustentou uma visão de otimismo do CEO do Bradesco.

“Não há problemas em consórcio. Estamos tranquilos. Apresentamos um aumento na receita”, disse Noronha.

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O mercado brasileiro de consórcios tem visto um aumento da competição.

No mês passado, a XP confirmou sua entrada nesse segmento, com foco em imóveis e automóveis, categorias lideradas pelo Bradesco. Já a Ademicon, administradora independente de consórcio, com planos de IPO (oferta inicial de ações), tem popularizado sua marca com exposição no BBB (Big Brother Brasil), reality show de ampla audiência na Globo, pelo terceiro ano seguido.

O CFO do Bradesco, Cassiano Scarpelli, disse que o ritmo de redução na quantidade de grupos administrados e consorciados indica uma estabilidade. Ele destacou as apostas para melhorar o resultado da área, como o foco em consórcios para o agronegócio e uma reformulação recente do app, facilitando a contratação pelos clientes com uma ferramenta de assinatura digital.

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“Recebemos o fee [comissão] dos grupos administrados. A inadimplência é dos grupos, e não do banco”, disse Scarpelli.

Apesar dos atrasos nessa categoria de produto, o retrato geral da qualidade do crédito do Bradesco trouxe alguns sinais benignos, como a redução de provisões para devedores duvidosos (PDD).

“A inadimplência acima de 90 dias viu novo recuo – o terceiro consecutivo, chegando a 4,8%, ainda que no conceito curto (15 a 90 dias), tenhamos visto nova deterioração no segmento Pessoa Física, mas que pode ser atribuído a um contexto sazonal”, observou o analista do BB Investimentos.

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No primeiro trimestre, as famílias brasileiras enfrentam tradicionalmente uma maior concentração de vencimentos devido às despesas extras com as compras do final do ano, o pagamentos de tributos e de matrículas escolares, além de reajustes anuais de aluguéis e apólices de seguros.

No chamado segmento massificado de clientes, o Bradesco tem disputado a preferência dos correntistas de baixa renda e de “pejotinhas” (microempreendedores, informais etc.) com bancos digitais como Nubank (NU) e Inter (INBR32), além de pesos pesados do setor como Santander e fintechs.

Em 2023, o Nubank superou o Bradesco em valor de mercado, mesmo sem agências físicas nem atuação em áreas de grandes volumes e mais rentáveis, como médias e grandes empresas, câmbio (em que acabou de receber aprovação regulatória), operações de atacado e de banco de investimento.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.